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Em 21 de abril de 1960, o Brasil inaugurou sua nova capital, Brasília. Do Planalto Central irradia a linfa vivificante que alimenta o interior do país. Reconhecida nacionalmente e internacionalmente como grande centro de decisões, de cultura e desenvolvimento.
A imprensa brasileira e estrangeira vem desde a fundação associando o nome de Dom Bosco aos destinos da nova Capital, evocando UM SONHO PROFÉTICO, do qual nos propomos apresentar os tópicos mais expressivos.
Não o transcrevemos integralmente porque é muito grande. Ocupa bem 10 páginas em corpo 8 nas Memórias Biográficas de Dom Bosco.
É indispensável notar que toda profecia é, de per si, obscura em seu enunciado, usando em sua expressão termos genéricos e linguagem imaginosa, figurativa.
Mesmo sob este ponto de vista, é admirável notar como Dom Bosco situou nitidamente no tempo e no espaço o objetivo de sua previsão, como veremos.
Para maior clareza, recordemo-nos que o sonho-visão data de 1883. Contou-o Dom Bosco numa reunião da Assembleia Geral da Congregação Salesiana, no dia 04 de setembro. O Pe. Lemoyne, que recolhia as memórias do Santo, transcreveu-o imediatamente, submetendo-o à correção de Dom Bosco. Este o examinou com atenção, acrescentando e modificando. Foi publicado nas páginas 385 a 394 do volume XVI das “Memorie Biografiche” de Dom Bosco, cuja primeira edição veio a público em 1935 (E. CERIA, Memorie Biografiche di S. Giovanni Bosco, vol. 16, Societa Editrice Internazionale (Torino, 1935).
Assim começa Dom Bosco a narração:
“Na noite que precedia a festa de Santa Rosa de Lima, 30 de agosto, tive um sonho. Percebi que estava dormindo e parecia-me, ao mesmo tempo, correr a toda velocidade, a ponto de me sentir cansado de correr, de falar, de escrever e de esforçar-me no desempenho das ocupações costumeiras. Enquanto hesitava se tratava de sonho ou de realidade, pareceu-me entrar em um salão, onde se achavam muitas pessoas, falando de assuntos vários”.
E o Santo reproduz profusamente o assunto da conversa, o que omitimos.
“… Nesse interim, aproximou-se de mim um jovem de seus dezesseis anos, amável e de beleza sobre-humana, todo radiante de viva luz, mais clara que a do sol…”.
E interrompemos de novo a descrição do amável guia, que o acompanhou durante toda a misteriosa viagem. Este se apresenta como amigo seu e dos Salesianos: vem, em nome de Deus, dar-lhe um pouco de trabalho.
“- Vejamos de que se trata. Que trabalho é esse?
– Sente-se a esta mesa e puxe esta corda.
Havia, no meio daquele salão, uma mesa, sobre a qual estava enrolada uma corda. Vi que essa corda estava marcada com linhas e números, como se fosse uma fita métrica. Percebi, mais tarde, que aquele salão estava situado na América do Sul, exatamente por sobre a linha do Equador, correspondendo os números impressos na corda aos graus geográficos de latitude…”
Segue-se a narração da vista de conjunto da América do Sul, segundo explicação do Santo:
“Observo que então via tudo de conjunto, como que em miniatura. Depois, como direi, vi tudo em sua real grandeza e extensão. Foram os graus marcados na corda correspondendo exatamente aos graus geográficos de latitude, que me permitiram gravar na memória os sucessivos pontos que visitei, viajando na segunda parte do sonho.”
“Meu jovem amigo continuava: – Pois bem, estas montanhas são como balizas; são um limite. Entre elas e o mar está a messe oferecida aos Salesianos. São milhares, são milhões de habitantes que esperam o seu auxílio; aguardam a fé.”
“Aquelas montanhas eram as Cordilheiras da América do Sul e aquele mar o Oceano Atlântico…”.
Prossegue a visão, mostrando a Dom Bosco como conseguiria guiar tantos povos ao rebanho de Cristo.
“Eu ia pensando: Mas para se conseguir isto, vai ser preciso muito tempo. Enfim exclamei em voz alta: Não sei mais o que responder.
Mas o moço, lendo meus pensamentos, ajuntou:
– Isto acontecerá antes que passe a segunda geração.
E qual será a segunda geração?
– A presente não se conta. Será uma outra, depois outra.
– E quantos anos compreende cada geração dessas?
-Sessenta anos.
-E depois?
– Quer ver o que sucederá depois? Venha cá.
E, sem saber como, encontrei-me numa estação de estrada de ferro. Havia muita gente. Embarcamos.
Perguntei onde estávamos. Respondeu o moço:
– Note bem! Observe! Viajaremos ao longo da cordilheira. O senhor tem estrada franqueada também para leste, até o mar. É outro dom do Senhor.”.
Assim dizendo, tirou do bolso um mapa, que mostrava assinalada a diocese de Cartagena (Colômbia). Era o ponto de partida.
“Enquanto olhava o mapa, a máquina apitou e o trem se pôs em movimento. Viajando, meu amigo falava muito, mas nem tudo eu podia entender, por causa do barulho do comboio. Aprendi, no entanto, coisas belíssimas e inteiramente novas sobre astronomia, náutica, meteorologia, sobre a fauna, a flora e a topografia daqueles lugares, que ele me explicava com maravilhosa precisão…
Ia olhando através das janelas do vagão e descortinava variadas e estupendas regiões. Bosques, montanhas, planícies, rios tão grandes e majestosos que não era capaz de os acreditar assim tão caudalosos, longe que estavam da foz. Por mais de mil milhas, costeamos uma floresta virgem, inexplorada ainda hoje. Meus olhos tinham uma potência visual maravilhosa, não encontrando obstáculos que os detivessem de estender-se por aquelas regiões.
Enxergava nas vísceras das montanhas e no subsolo das planícies. Tinha debaixo dos olhos as riquezas incomparáveis daqueles países, riquezas que um dia serão descobertas. Via numerosos filões de metais preciosos, minas inexauríveis de carvão, depósitos de petróleo tão abundantes como nunca se encontraram até então em outros lugares.
Mas não era tudo. Entre o grau 15 e 20, havia uma enseada bastante extensa, que partia de ponto onde se formava um lago. Disse então uma voz repetidamente: – quando se vierem cavar as minas escondidas em meio a estes montes, aparecerá aqui a terra prometida, que jorra leite e mel. Será uma riqueza inconcebível.”.
Continuava a viagem, ao longo da cordilheira, rumo ao sul.
“De novo pôs-se o trem em movimento, indo sempre para a frente. Como na primeira parte da viagem, atravessamos florestas, passávamos por túneis e viadutos gigantescos, internávamos por entre gargantas, costeávamos lagos e pantanais, transpúnhamos caudalosos rios, percorríamos, enfim, pradarias e planícies. Passamos, assim, as margens do Uruguai.”.
E continua a descrição das regiões fronteiriças, através da bacia do Prata, dos Pampas e da Patagônia, até o Estreito de Magalhães. Começa a viagem de volta. Na Patagônia,
Dom Bosco se entretém com os seus salesianos (de geração futuras). Atravessa a Argentina, penetra em uma floresta muito espessa, enorme, onde presencia o massacre de um estrangeiro, entregue à sanha de ferozes canibais.
Prossegue às margens de caudaloso rio, atravessando, afinal, uma região infestada de animais ferozes e de répteis repelentes. Estão chegando ao fim da viagem:
O trem se aproxima do lugar da partida e já estávamos a pouca distância. O jovem guia tirou do bolso uma carta geográfica de incrível beleza e me disse:
-Quer ver a viagem que o senhor fez? As regiões percorridas?
– Com muito gosto.
Desdobrou então o mapa, em que se desenhava com admirável exatidão toda a América do Sul. Ademais, já estava representado tudo o que existia, que existe, e haverá de existir naquelas regiões, sem confusão de espécie alguma, sem confusão de espécie alguma, pelo contrário, com tal nitidez que, de um só relance, se abrangia tudo. Compreendi tudo no instante, mas, pela multiplicidade das circunstâncias, durou pouco tal clareza, cedendo lugar à completa confusão que ora me ocupa a mente.
Enquanto observava aquele mapa, esperando que o rapazinho acrescentasse ainda alguma explicação, agitado que estava pela surpresa de tudo quanto vira, pareceu-me que soassem as Ave-Marias, ao alvorecer. Despertando, percebi que eram os sinos da paróquia de São Benigno.
O Sonho durara a noite inteira”.
Neste sonho, pudemos observar como Dom Bosco viu com exatidão as circunstâncias de tempo e lugar, bem como o objeto de sua previsão:
Tempo
Recordemos o diálogo:
-Isto acontecerá antes que passe a segunda geração.
– E qual será a segunda geração?
– A presente não se conta. Será uma outra, depois outra.
-E quantos anos compreende cada geração destas?
– Sessenta anos.
Se a primeira das sobreditas gerações começou em 1883, a segunda teve início mais ou menos em 1943. Estamos, pois, inteiramente dentro do período a que alude o sonho-visão.
Lugar
Dom Bosco localizou a faixa compreendida pelos paralelos 15 e 20, entre os Andes e o Oceano Atlântico. Exatamente entre os paralelos 15 e 16 foi localizada a nova Capital do Brasil.
O que viu Dom Bosco?
Embora o objeto de sua visão não seja exclusivamente nem mesmo explicitamente Brasília, podemos afirmar que Dom Bosco viu, em 1883, o que hoje, em parte, é realidade. Reforça a nossa convicção o teor mesmo da narração: “Quando vierem explorar as riquezas escondidas neste planalto, surgirá aqui a terra prometida, onde jorrará leite e mel. Será uma riqueza inconcebível.”. Ora, maior repercussão não obteve nenhuma outra descoberta, em outros pontos da referida faixa continental.
Ademais que Dom Bosco tivesse associado ao Brasil o presente sonho, está fora de dúvida. Compreendemo-lo melhor, se recordarmos que, em 14 de julho de 1883, alguns dias antes do sonho profético, desembarcavam no Brasil os primeiros Salesianos, para dar inicio a primeira fundação neste país. Toda a preocupação de Dom Bosco estava, naqueles dias, voltada para o Brasil. Testemunha o Pe. Filipe Rinaldi, terceiro sucessor do Santo, que o surpreendera em seu quarto, contemplando enternecido um atlas que focalizava exatamente o Brasil. Suas palavras então revelaram sua esperança no futuro do Brasil Salesiano, chegando a prever para sua obra, em nossa terra, duzentas casas! Era humanamente ridículo pensar em tão prodigiosos florescimento, quando aqui se implantara apenas uma casa, que lutava de todo gênero.
No maravilhoso sonho que viemos examinando, Dom Bosco abraçou, na extensão que lhe permitiu a visão profética, o desenvolvimento de sua obra, juntamente com o progresso material da Terra. Para este, já sorri, com a inauguração da nova Capital a aurora de radiante progresso, enquanto o fabuloso desenvolvimento da obra Salesiana é uma consoladora realidade.
Brasília, novembro 1995
Folheto entregue na Inauguração de Brasília