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2010
nov
30

O negro não é só isso

O Brasil abriga o maior número de negros fora da África. Como aprendemos na escola, a cultura negra faz parte da nossa história. Vieram para cá para servir como escravos. Eram vendidos como mercadoria. Mas lutaram muito e conquistaram a liberdade a duras penas. Essa trajetória contribuiu para a criação de uma imagem de submissão e inferioridade sobre as demais etnias, tão difícil de ser extirpada. E parte da culpa cabe aos meios de comunicação. 

Mídia e racismo, da editora Pallas, foi publicado em 2007 e construído a partir do resultado da participação de profissionais, pesquisadores e artistas no seminário que possui o mesmo nome, realizado em 2001 no Rio de Janeiro. Na obra, Sílvia Ramos, organizadora, afirma: “O racismo não se reproduz na mídia através da afirmação aberta da inferioridade e da superioridade, através da marca da racialização ou de mecanismos explícitos de segregação. As dinâmicas de exclusão, invisibilização e silenciamento são complexas, híbridas e sutis, ainda que sejam decididamente racistas”.

Através dos meios de massa – principalmente televisão e rádio – as desigualdades raciais são naturalizadas. Como achar comum em uma novela uma negra ser a empregada e uma branca a patroa, e estranhar o contrário. Desse modo, “as representações raciais são atualizadas e reificadas. E, feito ‘coisas’, circulam como noções mais ou menos comuns a toda a sociedade e como ideias mais ou menos sensatas”, reitera Sílvia.

Este ponto de vista é confirmado por André Rezende, editor-chefe da Raça Brasil, a única revista comercial voltada ao público negro no país. Para ele, o negro é visto de forma marginalizada, em universos cuja presença dele é maior: samba, pagode, festa black e futebol. Fora destes contextos, ele aparece na mídia de forma isolada, com personagens que se destacam em seu meio social e profissional ou em tempos de comemoração e reflexão: 20 de novembro, Dia da Consciência Negra; e 13 de maio, Abolição da Escravatura. 

A utilização da mídia para a conscientização e diminuição das desigualdades raciais no Brasil começou a ser explorada tardiamente e ainda está engatinhando. Mas essa mudança já é percebida. Carlos Botelho, 24, educador físico, afrodescendente, acredita que é a televisão o meio que mais pode ajudar na redução da exclusão racial. “A TV é o meio de comunicação mais usado do mundo. Nos últimos anos, ela melhorou a maneira de apresentar o negro para a sociedade. A mídia em geral deve mudar. Deve-se parar de usar o tema raça negra como forma de vender reportagem (sensacionalismo), e sim mudar da cabeça da sociedade”, conta.

Professor de Comunicação Social na Universidade Católica de Brasília, Lunde Braguini Júnior se orgulha por ser militante na luta contra o racismo. Branco afrodescendente, como se define, contribuiu por anos para o jornal Ìrohìn (‘notícia’ ou ‘boa nova’ em iorubá, língua africana), disponível na internet. Nele há um rico material crítico de como os negros veem e julgam as novelas, os filmes e a produção publicitária e jornalística. Lá, pode-se encontrar, por exemplo, uma análise do desenho Madagascar, feita do ponto de vista da luta contra o racismo.

Para Lunde, a mídia  tem sido estratégica na luta racial que se trava no país, pois é um dos vetores de ampliação do ponto de vista branco e de minimização do ponto de vista negro. “Procuro colaborar fazendo críticas e também muita autocrítica, já que nossa cabeça branca nos torna mais parte do problema que da solução”, confessa. O papel decisivo da mídia na diminuição das desigualdades raciais é um consenso entre os especialistas. “Nenhum processo cultural de superação do racismo, de combate aos estereótipos e de luta contra a discriminação será realizado sem os jornais, a televisão, as artes e a música”, afirma Sílvia Ramos no livro Mídia e racismo

Promover a participação plena dos afrodescendentes em cargos de gestão nos meios de comunicação, nas empresas em geral e no governo; estimular o desenvolvimento de mídias que divulgam a raça negra; e disseminar campanhas de engajamento na luta antirracista são iniciativas sociais necessárias para a igualdade de oportunidades a todas as pessoas.

Publicado por Tiago Mendes

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