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A temática da 22ª Semana de Filosofia surgiu do interesse em se discutir problemáticas filosóficas a partir do contexto latino-americano. Para tanto, o evento foi organizado visando abordar os mais diferentes aspectos da reflexão filosófica produzida fora do contexto europeu.
No primeiro dia, 19/09, ocorreu uma mesa redonda com o tema “Questões do livro “A colonialidade do saber”, de Edgardo Lander (org.)”. Os componentes da mesa foram os professores do Curso de Filosofia da UCB, Luis Alberto Delgado e Maximino Basso, além do estudante Davi Félix da Silva. Na ocasião, foram destacados os seguintes capítulos da referida obra: Europa, modernidade e eurocentrismo (Enrique Dussel); Ciências sociais, violência epistêmica e o problema da “invenção do outro” (Santiago Castro Gomez); Superar a exclusão, conquistas e equidade: reformas políticas e capacidades no âmbito social (Alejandro Moreno); Colonialidade do poder, eurocentrismo e América Latina (Aníbal Quijano).
Os três componentes da mesa deram destaque a questões cruciais da relação nem sempre amistosa entre o pensamento europeu e as reflexões produzidas no âmbito da América Latina. Segundo eles, historicamente, sempre houve a predominância de uma colonização intelectual e teórica fundada a partir do processo de ocupação territorial empreendida pelos europeus. A partir das concepções anunciadas pelos pensadores citados, foi possível perceber o trabalho de ruptura inaugurado por boa parte dos intelectuais latino-americanos. Destaca-se aqui, por exemplo, a ênfase na abordagem dos problemas éticos propostos pelo filósofo argentino Enrique Dussel.
Nos dias 20 e 21, os trabalhos foram apresentados pelo professor José Gonzalo Armijos Palácios, da Universidade Federal de Goiás – diretor do campus da UFG da Cidade de Goiás. Ele apresentou as temáticas: “A natureza do ato de filosofar” e “O ensino da filosofia e seu propósito: formar filósofos”. A preocupação do professor Gonzalo foi destacar três aspetos que, segundo ele, são fundamentais para aquele que decide pela atitude filosófica: a natureza da filosofia, o significado da filosofia e o ensino da filosofia. Esses são pontos fundamentais e indissociáveis quando consideramos a possibilidade concreta de uma leitura crítica e reflexiva acerca do mundo e de nós mesmos.
Ainda segundo o professor, é fundamental percebermos o movimento dinâmico que constitui a filosofia e o ato de filosofar. Segundo ele, “A reflexão filosófica não está fechada a determinados assuntos, pois o mesmo pensador muda seu posicionamento de forma radical.”
Na quinta-feira, 22/09, tivemos a presença da professora Juliana Amoretti. A doutora em Ciências Sociais pela UnB e funcionária da Secretaria de Direitos Humanos, apresentou a comunicação “Mariátegui e o marxismo na América Latina”. Foi destacada a maneira como o filósofo peruano interpretou as questões fundadas por Karl Marx, sendo enfatizados ainda, os modos como o marxismo ganhou espaço no contexto sócio-cultural-econômico da América Latina. Uma das preocupações fundamentais da expositora foi acentuar também que a filosofia de Mariátegui pode ser considerada o início da tradição marxista latino-americana.
No dia 23/09, sexta-feira, foi apresentada, pelo professor Luiz Cláudio Batista de Oliveira, do Curso de Filosofia da UCB, a comunicação “A filosofia na América Latina como problema do homem: originalidade e autenticidade em Leopoldo Zea”. O objetivo da abordagem foi destacar os pontos que caracterizam a reflexão deste filósofo mexicano: a concepção de homem atrelada ao sentido de originalidade e de autenticidade são, segundo Zea, aspectos fundamentais que distinguem o modo de pensar latino-americano do europeu. Ainda segundo o estudo proposto, Leopoldo Zea compreende o pensar filosófico não europeu como filosofia sem mais, pois é elaborada e concebida por um homem que vivencia e funda modos de ser, de sentir e de se relacionar singulares, pois expressam e aspiram a concretização de uma filosofia do homem e para o homem, onde quer que este se encontre.
Seguem abaixo comentários de alguns estudantes a respeito da Semana de Filosofia:
"Desde que entrei no curso, considero esta a melhor semana de filosofia, o tema (Filosofia na América Latina: Diálogos Interculturais) foi bastante interessante e nos levou a tantas outras reflexões que tal questão pode nos proporcionar. Os assuntos debatidos há algum tempo já vêm sendo discutidos entre os estudantes e a semana nos ajudou a esclarecer alguns pontos, entre tantos, a necessidade de se formar filósofos nas academias brasileiras e acredito ter sido esse o ponto que mais nos chamou a atenção, já que vai diretamente ao encontro com a nossa formação e sem nenhum momento fugir do tema proposto para a semana, por mais que já tivéssemos levantados questionamentos sobre esse tema, a palestra nos chegou com um tom de novidade o que nos motivou a não encerrar as indagações surgidas nas palestras. É de extrema importância ocasiões como a semana de filosofia, nos permitem ir além da sala de aula, compartilhar nossas indagações e impressões sobre determinado assunto, pois a troca que acontece durante o encontro é bastante rica."
Jéssica Mamede da Silva, estudante do quinto semestre do Curso de Filosofia da UCB.
“Esta última semana de filosofia foi muito interessante! Enérgica, nos fez perceber, discutir, e procurar entender sobre as razões pelas quais é importante de se pensar tal como se pensa, filosofar a partir do contexto em que se está inserido, criar problemas com os quais dialogar conhecendo seu motivo e o porquê de sua importância. Com certeza esta semana de filosofia foi bem diferente das outras, não somente pela sensibilidade de perceber a relevância do pensamento que pensamos e em como o pensamos para os rumos da filosofia, admitindo a existência de aberturas para temáticas que questionam a legitimidade da colonização dos estudos feitos até então pelo percurso da filosofia sem, contudo, deixar de admitir sua importância e não deixando de também os levar em consideração. Foi uma semana que, certamente, possibilita o exercício da filosofia verdadeira, e na sua essência que consiste ato singular do filosofar.”
Luzinete Pereira de Sousa, estudante do quinto semestre do Curso de Filosofia da UCB.
“A Semana de Filosofia da Universidade Católica de Brasília – UCB – proporcionou a todos os estudantes e professores presentes, exposições e diálogos extremamente significativos e fecundos, visto que a temática proposta e debatida, A Filosofia na América Latina, nos fez pensar e rever os nossos conceitos e filosofias assimiladas. Desta forma, o embate de ideias e, por conseguinte, a troca de experiências ocorridas na Semana de Filosofia, mostraram-se inteiramente válidas, demonstrando, com isso, que esse evento, que nos faz pensar o nosso contexto, tenha espaço constante, tanto na universidade como fora dela.”
Rodrigo Amorim Castelo Branco, estudante do sexto semestre do Curso de Filosofia da UCB.
”A Semana de Filosofia de 2011 foi muito positiva, pois proporcionou o debate entre docentes e discentes sobre o pensamento latino-americano, filosofia que ainda não é muito discutida no meio acadêmico. A iniciativa da direção do curso, de abrir espaço para essa discussão foi bastante proveitosa, uma vez que as comunicações, em sua grande maioria, foram muito bem apresentadas, proporcionando assim debates instigantes. Conhecer a tradição filosófica é indispensável, mas por que não estudar os pensadores brasileiros e latino-americanos? Cada filosofia possui suas peculiaridades, e não adianta pretender que a produção filosófica da América Latina seja como a europeia, e nem pretendermos que uma seja superior a outra, o que podemos pensar são os possíveis diálogos que essas diferentes filosofias podem proporcionar. E isso parece ter ficado muito claro no decorrer da semana. Além desse debate, tivemos também a exposição sobre a questão do ensino da filosofia. Será que os departamentos de filosofia fomentam o desenvolvimento de filósofos ou historiadores da história da filosofia? Questão bem abordada pelo professor Gonzalo. Com isso posso dizer que fiquei satisfeita com o resultado das discussões ocorridas nessa semana.”
Angélica Medeiros Marques, estudante do quinto semestre do Curso de Filosofia da UCB.
“A Semana de Filosofia foi instigante, pois se debruçar sobre uma filosofia que por vezes fica esquecida nas universidades e nas escolas, mostra que estamos reaprendendo, como afirma a concepção merleau-pontyana, a ver o mundo; rompendo com o paradigma eurocêntrico, e com a valorização apenas dos filósofos "clássicos". Os que se debruçam sobre a filosofia, devem perceber que há várias filosofias, e elas devem ser conhecidas, em especial a filosofia latino-americana que reflete sobre assuntos inerentes ao povo brasileiro; fala sobre a sua realidade, parte do seu contexto, que muitas vezes é repleto de miséria, exploração, por ainda viverem os frutos da colonização. E estudar a filosofia que problematiza a realidade desses seres humanos, muitas vezes não reconhecidos, é uma forma de retomar a sua humanização; lutar com eles em busca da dignidade que tanto almejam; pois ao se propagar esse conhecimento de forma crítica, leva à mobilização, a uma nova forma de pensar que não exclui os "pensadores tradicionais da filosofia", mas em diálogo com eles, faz novas interpretações da realidade, e das obras desses filósofos valorizando agora a sua cultura, a sua origem; a singularidade da população latino-americana. A semana de filosofia foi um espaço privilegiado para discutir, pensar e repensar essa filosofia; com universitários de vários cursos, o que enriqueceu esse diálogo, trazendo várias visões sobre o mesmo tema.”
Sara de Araújo Feitosa, estudante do sexto semestre do Curso de Filosofia da UCB.