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2023
set
19
Elena de Jesus Fuentes (esquerda) com a professora Nádia (3ª da esquerda para a direita) e colegas de curso. Foto: arquivo pessoal.
Extensão

Português para Migrantes e Refugiados: direitos e cidadania

No Dia do Educador Social, 19 de setembro, a Universidade Católica de Brasília (UCB) celebra o sucesso de um projeto de extensão com grande impacto na vida das pessoas. O Curso de Língua Portuguesa para Migrantes e Refugiados concede o certificado de proficiência na língua a estrangeiros que pretendem se estabelecer no Brasil. Esse é um requisito exigido pelo governo para o processo de naturalização. Dessa forma, a UCB contribui para a garantia de direitos e cidadania a essas pessoas.

O curso surgiu de uma demanda do Instituto Migração e Direitos Humanos (IMDH), instituição que apoia migrantes, refugiados e apátridas na defesa de direitos, cidadania, assistência jurídica e humanitária, além de integração ao mercado de trabalho e inclusão em políticas públicas.

Desde a criação, em 2015, mais de 800 pessoas aprenderam português gratuitamente na UCB e cerca de 90% conseguiram o certificado de proficiência. “E quem não consegue, não significa que está reprovado. A gente só convida para que ele faça mais um semestre”, explica o coordenador do projeto, José Ivaldo Lucena. “Tem aluno que faz os seis meses, tira o certificado de proficiência e mesmo assim pede para continuar, porque, para ele, é mais importante aprender do que somente conseguir a naturalização, que é para vida.”

Mais do que a língua

O curso ajuda a recuperar vidas pessoas que muitas vezes são obrigadas a deixar o país de origem e chegam ao Brasil em situação precária. Além disso, traz empoderamento aos alunos. Ajuda no enfrentamento a diversos tipos de abuso que possam sofrer por não falarem a língua portuguesa e pela fragilidade inerente à condição de migrante ou refugiado, principalmente no trabalho. “Eles são mão de obras barata aqui no Brasil, né? São patrões que não pagam, às vezes, ou exploram muito”, exemplifica o professor.

Eliana de Jesus Fuentes (42) trabalhava para o governo na Venezuela. Ela descobriu um esquema de corrupção que envolvia um general do Exército e passou a ser perseguida. Sem encontrar outra alternativa, resolveu fugir do país. Passou primeiro pela Colômbia e depois veio para o Brasil. Chegou a Boa Vista (RO) em 2019. Sem dinheiro, ficou uma semana vivendo na rua, até conseguir dinheiro e mudou-se para Brasília.

Na Capital Federal, morou de favor na casa de amigos venezuelanos que a ajudaram a conseguir emprego. Com o trabalho, conseguiu alugar um quarto, mas renda não era suficiente para cobrir as despesas. “Às vezes eu não comia para poder pagar o aluguel, senão eu não teria uma cama, não teria nada”.

O que mais dificultava a adaptação de Eliana era a barreira da língua. “A gente não falava nada de português, não entendia nada em português. Era muito difícil”, recorda. Por indicação de amigos, matriculou-se no curso da Católica e conseguiu alcançar a proficiência. Depois disso as coisas melhoraram.

“Há dois anos consegui a residência permanente graças à Católica”, comemora. No mesmo ano, trouxe o filho de 21 anos para morar em Brasília. Ela conquistou um emprego em um restaurante, onde faz trabalho administrativo e ajuda em outras atividades. Outra vitória foi matricular-se em cursos profissionalizantes em desenho gráfico e marketing no SENAI.

Eliana destaca que o curso vai além do aprendizado da língua e a obtenção do certificado. A maior contribuição, segundo ela, é o relacionamento com os professores, o caráter humanístico do projeto. “Quando fiquei internada no HRT [Hospital Regional de Taguatinga] para fazer uma cirurgia de vesícula, eu não tinha dinheiro, não tinha comida, não tinha nada”, relata. “A professora Lene me perguntou como eu estava. Eu falei que tinha feito a cirurgia e estava em uma cama, sem nada. Eles levaram comida, algumas coisinhas. O maior apoio que um recém-operado pode receber”, completa.

Ao lembrar-se do episódio, o professor José Ivaldo conta que, após a alta médica, visitou Eliana e se comoveu com a situação dela. Sem trabalho, a renda cessou. “A gente conseguiu cesta básica, fez a visita. Quando chegou lá, não tinha fogão, não tinha botijão, não tinha nada. E a gente conseguiu doação de fogão, doação de botijão e foi lá para ajudar.”

Sobre o curso

As aulas são ministradas por estudantes de diversas graduações da Católica, como Relações Internacionais, Letras, Medicina e Direito. Há também voluntários externos, especialmente professores que se aposentaram na Secretaria de Educação do Distrito Federal. Todos atuam voluntariamente. A UCB garante salas de aula com recursos audiovisuais e provê os recursos humanos para a coordenação. O custo financeiro é basicamente com as xérox das apostilas e a compra do material didático (lápis, borracha papel). Atualmente a Fundação La Salle coopera com o custeio desses insumos.

O método de ensino parte da bagagem dos alunos para que eles aprendam a língua naturalmente, com base nas suas próprias culturas e situações cotidianas. O professor José Ivaldo explica que “tudo é conteúdo de aprendizagem: as relações, os desafios, os sonhos, a culinária deles. Isso tudo é tema de discussão na sala de aula. Por isso que a gente chama de ‘português como língua de acolhimento’, porque a gente acolhe a cultura deles, eles acolhem a nossa”.

Novas turmas são formadas no início de cada semestre. Para mais informações, entre em contato pelo telefone: (61) 3356-9032 ou pelo e-mail: projetosermais@ucb.br

Publicado por Samuel Siqueira
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